sexta-feira, 19 de julho de 2013

DE ALAN PARKER A WALCYR CARRASCO

Por José Farid Zaine
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Há algumas semanas, vendo os primeiros capítulos de “Amor à Vida”, de Walcyr Carrasco, a atual novela das 9 da Globo, eu me deparei com uma sequência rigorosamente igual a uma que está no filme “O Expresso da Meia-Noite”(Midnight Express), de Alan Parker. Gosto demais desse filme de 1978. A cena a que eu me refiro é aquela em que Billy Hayes, personagem de Brad Davis, tenta sair da Turquia com pacotes de haxixe na cintura. Ele está com a namorada, e ao perceber a grande quantidade de policiais  prestes a revistarem os passageiros, pede que ela entre no avião e vá embora de qualquer maneira. Na novela “Amor à Vida”,logo no primeiro capítulo, a personagem de Juliano Cazarré, Ninho, namorado de Paloma (Paola Oliveira) faz a mesma coisa. Até a respiração de Brad Davis, numa cena no banheiro do aeroporto de Istambul, é copiada por Cazarré.



Ao ver a cena pensei que o autor estivesse fazendo uma homenagem ao filme, pois a cópia era explícita demais.Qualquer pessoa que tenha visto a obra de Parker, tanto no cinema quanto no DVD, pois tornou-se um clássico e é sempre muito lembrado, percebe imediatamente a semelhança. Há alguns dias, no entanto, matéria da Folha de São Paulo registra esse fato, assim como revela muitas outras “coincidências” da trama de Walcyr com filmes, outras novelas e seriados. Até a bengala do Dr.House foi parar nas mãos de Mateus Solano, o sensacional Félix. 
Tenho certeza de que Walcyr Carrasco, como todos os outros autores, fazem sim referências a filmes de que gostam muito, a seriados, novelas, e até mesmo copiem seus próprios textos. Escrever para uma novela das 9 passou a ser um peso demasiadamente grande para um autor só, e hoje há uma equipe de “colaboradores” que mergulham na hercúlea tarefa de criar longos capítulos diários que sejam interessantes, mantenham sempre um alto grau de suspense, tenham drama misturado com muita ação e comédia, tenham alta qualidade técnica e ainda passem pelo crivo de telespectadoras que apontam o que vai bem e o que não vai, pela ótica de donas de casa, as principais consumidoras do produto. Não é fácil, mas seria ético e justo copiar sem dar créditos aos autores originais?
Quando tudo está engrenado, gravações em dia, elenco satisfeito e produção tranquila,  mas a audiência não corresponde à expectativa da emissora, é exigida uma remexida na trama, que às vezes pode chegar a drásticos cortes no elenco e até mesmo encurtamento da novela. Como sobreviver a tanta pressão criando somente coisas originais, sem recorrer a fórmulas já testadas, cópias conscientes ou não, e até a personagens e histórias paralelas que parecem se repetir indefinidamente?
Lembrei-me de citar o filme “O Expresso Da Meia-Noite”, de 1978,  para que os leitores possam fazer uma revisão dele, principalmente os que se lembrem da cena da novela que citei. Sempre vale a pena rever esse grande sucesso de Alan Parker, que projetou Brad Davis no cinema, e pelo qual ele ganhou um Globo de Ouro. Ele teve uma carreira curta, pois morreu de Aids em 1991, pouco antes de completar 42 anos. Depois de “O Expresso”, pela bela cena que  em que Billy Hayes e seu companheiro de cela se beijam durante um banho na prisão  – o que era muito incomum para a época – especulava-se muito sobre a sexualidade dele. Quando se noticiou sua morte por AIDS (ele era casado e tinha uma filha), acentuou-se essa discussão. A AIDS de Davis parecia estar mais ligada ao consumo de drogas.  De qualquer forma,outro grande momento de sua carreira também o colocava na pele de uma personagem homossexual, o marinheiro  Querelle, do filme do mesmo nome dirigido por Rainer Werner Fassbinder. Excelente exemplar da obra do diretor alemão, “Querelle” também é facilmente encontrado nas locadoras e lojas virtuais.

Vejamos então os filmes de Brad Davis, tocados pela lembrança provocada pela novela “Amor à Vida”. Depois do fiasco de “Salve Jorge”, a incrível miscelânea de Glória Perez, a Globo precisava de um socorro para o seu principal horário, em que o Brasil para diante da TV. Os sucessos anteriores de Carrasco garantiram que ele alçasse voo a um dos postos mais cobiçados da televisão brasileira, e ele lá está com sua colcha de retalhos muito bem costurada para servir pratos diários, requentados ou não, ao faminto público das novelas. Por muitos meses ainda, vamos nos divertir com as sensacionais Elizabeth Savalla e Tatá Werneck, Tetê e Valdirene, respectivamente, com as perversidades cômicas e os “bofes” de Félix (Mateus Solano),  e com as inacreditáveis histórias que acontecem dentro de um Hospital! Não, não é nada fácil fazer o equivalente a um filme por dia. As “homenagens” – para não dizer os plágios – estão perdoadas.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

SÓ OS BONITÕES PODEM SALVAR O MUNDO


Por José Farid Zaine
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Superman agora é bastante humano, está sempre angustiado pela incompreensão de quem realmente é, de onde veio e qual é sua missão verdadeira. Sua humanidade, contudo, que não exclui os ilimitados poderes, vem com algo de divindade: ele tem trinta e três anos e morrerá, se for preciso, para salvar o mundo. A semelhança com a história mais contada de todos os tempos, não é mera coincidência, embora seja explicitada por um ou outro detalhe que não podem passar desapercebidos.



“ O Homem de Aço” (Man of Steel), que estreia nesta sexta em todo o Brasil após muitas pré-estreias, finalmente traz uma nova face que o público recebe e aceita bem, deixando ficar no passado a imagem de Christopher Reeve, a mais perfeita encarnação do super-herói . O drama pessoal de Reeve, que comoveu o mundo, só aumentou o carinho dos fãs pela imagem que ele fixou nas telas, já que sempre houve uma inevitável comparação entre a personagem –praticamente indestrutível - com o ator exibindo ao mundo sua fragilidade, numa cadeira de rodas, após um acidente que o deixaria tetraplégico e o levaria à morte, após longa e dolorosa luta.
Christopher  Nolan, que imprimiu uma personalíssima visão para Batman em uma trilogia , principalmente em “O Cavaleiro das Trevas”, está presente em “O Homem de Aço” como produtor e roteirista, ao lado de David S. Goyer. É bem visível a participação de Nolan. Já a direção foi delegada para Zack Snyder, sobretudo por seu conhecido talento para filmar lutas. O visual é arrebatador e o filme atende às exigências das plateias contemporâneas, principalmente aquelas formadas pelo público mais jovem, que também prefere ação vertiginosa e barulhenta. E muito barulho é o que não falta nesta  aventura, totalmente em sintonia com a nova geração para contar o início de uma história consumida desde 1938, quando foi publicada em quadrinhos pela primeira vez.
Como divertimento bem acabado, “O Homem de Aço” cumpre plenamente sua função. A escolha de Henry Cavill, ator inglês pouco conhecido até agora, embora tenha feito vários filmes,  resultou perfeita. Ele tem o tipo físico totalmente apropriado para ficar inteiramente à vontade tanto para interpretar  o repórter Clark Kent e seus óculos de aros escuros como para vestir a capa vermelha e o uniforme azul de Kal-El, o  Superman, pela primeira vez sem a sunga por cima. O elenco é ótimo, com um time secundário que é um verdadeiro luxo: Diane Lane e Kevin Costner são os pais adotivos  de Clark  e Russel Crowe é Jor-El, o pai kryptoniano.  Na linha de frente, juntamente com Cavill, temos Amy Adams como Lois Lane  e o excelente Michael Shannon como o General Zod.



A música de Hans Zimmer é brilhante, como sempre, e o conhecidíssimo tema do Superman, de John Williams,  ficou para trás. Os efeitos sonoros e a edição de som são excelentes, embora às vezes o filme fique com certa overdose de barulho. Os efeitos visuais, por sua vez, sempre espetaculares, não raro nos remetem às pirotecnias  tipo “Transformers”, e isso é um ponto fraco da produção.
Com menos malabarismos e explosões está em cartaz outro blockbuster, em que a humanidade também precisa ser salva , só pra variar. No caso, de multidões de zumbis criadas por um vírus. Os mortos-vivos são velozes e querem infectar cada vez mais pessoas. As cenas em que se amontoam como formigas para pular os muros que protegem Jerusalém são fantásticas. O salvador do mundo, nessa sombria ficção, que também anda pelas ruas de Jerusalém, é nada mais nada menos que Brad Pitt. O filme em questão é “Guerra Mundial Z”, dirigido por Marc Forster ( o mesmo de “O Caçador de Pipas” e “Quantum of Solace”), muito bom porque as soluções apresentadas para acabar com a praga dos zumbis são biologicamente aceitáveis.

Como se vê, é um pré-requisito fundamental que o salvador do mundo seja forte e, antes de tudo, bonitão, seja ele um alienígena vindo de Krypton ou um terráqueo corajoso. Os produtores precisam, desde que o cinema foi criado, testar o poder de sedução de suas estrelas. 

sexta-feira, 5 de julho de 2013

ANTES QUE SE FECHEM AS CORTINAS

Por José Farid Zaine
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É certo que a velhice é realmente assustadora, que todos pensam como um dia lidarão com isso na vida. Claro, se a pessoa tiver bastante sorte, ela envelhecerá, pois não envelhecer significa morrer jovem. Portanto, fica claro que a esmagadora maioria da humanidade não deseja morrer cedo...Os avanços da medicina já se fazem notar numa população que fica cada vez mais velha, e a idade avançada pode ser curtida com  mais qualidade. Muito se fala sobre a chamada “melhor idade”, título que muitos adotam e muitos odeiam. O cinema tem se debruçado bastante sobre o tema ultimamente, com bons resultados, que vão da obra-prima “Amor”, de Michael Haneke, um drama contundente, às amenidades de “O Exótico Hotel Marigold”, “E se vivêssemos todos juntos” e a recente comédia romântica “O Quarteto”, dirigida por Dustin Hoffman, em cartaz em várias cidades,  só para citar filmes bem recentes.




Para muitas profissões a chegada da velhice, com a aposentadoria, pode significar um prêmio, a possibilidade de descanso pode vir como uma bênção, e aí podemos citar trabalhadores braçais, operários de diversos ramos de atividades, professores...Mas para os artistas a chegada da velhice é sempre mais complicada. “Deixem-me sozinha”, teria dito Greta Garbo, uma das divas do cinema, recolhendo-se ao seu claustro voluntário para não exibir publicamente a decadência física. No terrível “O Que terá acontecido a Baby Jane?” a coisa é a mais dramática e cruel, pois a personagem vivida por Bette Davis ainda se liga, mesmo com a idade avançada, a um período de sucesso vivido na infância. Como aceitar a passagem do tempo inexorável, que deixa suas marcas impiedosas principalmente no rosto das mulheres que foram lindas? Tentativas desesperadas de preservação da fase áurea da vida podem criar,via cirurgias plásticas, verdadeiros monstros. É certo que a forma com que as pessoas encaram o ocaso da existência varia muito. Muitos atletas poderosos, exemplos de perfeição física, acabam seus dias como instrutores, treinadores, e não se sentem infelizes com a consciência das limitações que o tempo traz à prática do esporte que os consagrou durante a vida.
Pensando nessas questões, o ator Dustin Hoffman, já com 75 anos, produziu e dirigiu “O Quarteto”, sobre um grupo de músicos aposentados que vivem juntos numa “Casa de Repouso” luxuosa, embora prestes a fechar as portas. Eles são representantes principalmente da música erudita, instrumentistas e cantores de ópera. Para eles o envelhecimento é muito mais complicado: As vozes já não alcançam as notas, o fôlego já não é o mesmo, e muitas vezes a audição diminuída pode ser uma perversa contribuição para a piora do quadro geral... “O Quarteto” leva essas questões com leveza e bom humor. A história é ótima, embora completamente inverossímel. Um ótimo elenco se encarrega de garantir o interesse do começo ao fim, e isso é feito na dose certa, pois o filme é enxuto, com cerca de 90 min de duração.
O saboroso desenrolar da trama não nos prepara sustos, nem reviravoltas. O espectador aguarda, naturalmente, que a reunião do quarteto de cantores, com todas as limitações possíveis advindas da idade, com a guerra de egos que nunca tem fim, com um romance requentado, chegue a bom termo. A forma com que Hoffman conduz a trama, ocultando delicadamente as vozes dos quatro cantores quando rolam os ensaios do Rigoletto, de Verdi, é envolvente e chega a comover. O que veremos? Um fiasco provocado pela perda natural do potencial vocal do quarteto? Um sucesso retumbante que coloque velhos e conhecidos astros e estrelas da música lírica sob os holofotes da mídia e aplausos da crítica? A solução é mais do que original e apropriada.
Apesar de todo o elenco ser muito competente, Maggie Smith, naturalmente, rouba a cena. A grande dama do cinema inglês mais uma vez impõe  sua figura extraordinária para compor uma cantora lírica de ego inflado, cheia de recordações dolorosas, e que precisará reavaliar seu comportamento diante dos outros, da velhice e da arte. Smith é muito bem acompanhada por Tom Courteney, Pauline Collins e Billy Connolly.

“O Quarteto” não é uma obra-prima, nem sequer um grande filme. Mas pode ser visto com muito prazer e com muita ternura. Não há amargura no desenrolar da história, e mais uma vez vemos, pelos olhos de um cineasta, que na vida do artista sempre haverá espaço para o brilho antes que se fechem as cortinas!