sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

COMO SE FOSSE AO VIVO



 Por José Farid Zaine
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“Lincoln”, de Steven Spielberg, chegou ao Brasil na semana passada embalado pelas 12 indicações ao Oscar anunciadas no dia 10 de janeiro. É o recorde deste ano para os prêmios da Academia, com entrega marcada para o dia 24 de fevereiro. Até lá, ou mais precisamente até o último dia para a votação, dia 19, os membros da Academia estarão atentos às diversas premiações que antecedem o Oscar e são, via de regra, termômetros que podem influenciar nas decisões. Em pelo menos três das doze indicações “Lincoln” pode ser considerado quase imbatível:  melhor ator para Daniel Day Lewis, melhor ator coadjuvante para Tommy Lee Jones e melhor roteiro adaptado para Tony Kushner, que já fez para Spielberg o roteiro do ótimo “Munique”, pelo qual Kushner foi indicado ao Oscar, mas perdeu para “O Segredo de Brokeback Mountain”. Ele é também autor do celebrado texto de “Angels in America”.

Como é comum em sua carreira brilhante, Daniel Day Lewis se entregou completamente para a criação de seu Lincoln, e o resultado não poderia ser melhor. Lewis nos dá vida completa à imagem que temos do grande Presidente americano, o 16º , amado por gerações desde seu assassinato, poucos dias após o término da guerra civil americana, que  opôs o Norte ao Sul e deixou milhares de mortos, e poucos meses após a aprovação da 13ª Emenda à Constituição, que aboliu a escravatura nos EUA. Cada gesto, cada olhar, cada silêncio, cada palavra  - e são muitas – tudo foi meticulosamente estudado pelo ator que já tem 2 Oscar no currículo ( “Meu Pé Esquerdo” e “Sangue Negro”) e está a caminho do terceiro, sempre merecidamente. Sinais de seu favoritismo foram confirmados pelo Globo de Ouro como Melhor Ator Dramático, entregue no dia 13 de janeiro, e pelo SAG (Screen Actors Guild) de Melhor Ator, que ele venceu no domingo passado.



Tommy Lee Jones é outra força de “Lincoln”. Ele está magnífico como o abolicionista Thadeus Stevens, e sua presença ilumina todas as cenas de que participa, principalmente as dos debates no Congresso, quando republicanos e democratas se enfrentam em inflamados duelos verbais na discussão da aprovação da 13ª Emenda. Jones, em 1994, ganhou o Globo de Ouro e o Oscar de melhor ator coadjuvante por “O Fugitivo”. Na semana passada, junto com Lewis, ganhou o SAG de ator coadjuvante por “Lincoln”.

Para compor a problemática e depressiva esposa de Abraham Lincoln, Mary Todd Lincoln, Spielberg fez outra escolha acertada, a de Sally Field, também já premiada como melhor atriz, tanto no Globo de Ouro como no Oscar, em “Norma Rae”, de 1979, e “Um Lugar no Coração” , de 1984.

“Lincoln”, com certeza, não agradará tanto às grandes plateias quanto os filmes mais amenos e de grande popularidade do diretor de “Tubarão”, “ET” e “Indiana Jones”. Aqui estamos diante de uma obra sóbria, construída sobre um roteiro que privilegia os diálogos, as discussões, as ideias em detrimento do espetáculo. Tudo é muito discreto, para que não se fuja à proposta. Contudo, o filme é também grandioso em sua forma, com excelente direção de arte, figurinos, fotografia, trilha sonora, tudo o que dá a “cara” de superprodução a um filme. Não se podia esperar outra coisa de Spielberg e aí ele não decepciona. Um dos mais aclamados diretores americanos agora também espera pelo seu terceiro Oscar. Ele o levou para casa duas vezes, assim como o Globo de Ouro, em dois grandes dramas de guerra, “A Lista de Schindler”, em 1994, e “O Resgate do Soldado Ryan”, em 1999.

O grande trunfo de “Lincoln” é mostrar os bastidores de uma das maiores conquistas do povo americano, a votação da emenda que colocou fim à escravidão no País. Tudo é revelado com a solidez de um roteiro magnificamente construído e com o trabalho minucioso e bem dirigido de um elenco talentosíssimo. Aliás, nesse quesito, “Lincoln” perdeu o SAG para o elenco de “Argo”, dirigido por Ben Affleck e que concorre ao Oscar em sete categorias, incluindo a de melhor filme, mas com Affleck fora das indicações para melhor direção. Um grande passo de “Argo”, com certeza.

Raras vezes o cinema nos deu mergulhos tão profundos de seus intérpretes em suas personagens como Daniel Day Lewis faz em “Lincoln”. Recentemente Marion Cotillard deu vida transbordante a Edith Piaf  em “Piaf – Um Hino ao Amor” e Meryl Streep recompôs, com assombrosa perfeição, a Primeira-Ministra Britânica Margaret Thatcher em “A Dama de Ferro”. As duas levaram o Oscar. Não é exagero dizer que Lewis, com sua impressionante criação de Lincoln, faz com que o presidente fale agora com  todo o mundo, através deste filme. E é como se fosse ao vivo.

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