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Há algumas semanas, vendo os
primeiros capítulos de “Amor à Vida”, de Walcyr Carrasco, a atual novela das 9
da Globo, eu me deparei com uma sequência rigorosamente igual a uma que está no
filme “O Expresso da Meia-Noite”(Midnight Express), de Alan Parker. Gosto demais
desse filme de 1978. A cena a que eu me refiro é aquela em que Billy Hayes,
personagem de Brad Davis, tenta sair da Turquia com pacotes de haxixe na
cintura. Ele está com a namorada, e ao perceber a grande quantidade de
policiais prestes a revistarem os
passageiros, pede que ela entre no avião e vá embora de qualquer maneira. Na
novela “Amor à Vida”,logo no primeiro capítulo, a personagem de Juliano
Cazarré, Ninho, namorado de Paloma (Paola Oliveira) faz a mesma coisa. Até a
respiração de Brad Davis, numa cena no banheiro do aeroporto de Istambul, é
copiada por Cazarré.
Ao ver a cena pensei que o autor
estivesse fazendo uma homenagem ao filme, pois a cópia era explícita
demais.Qualquer pessoa que tenha visto a obra de Parker, tanto no cinema quanto
no DVD, pois tornou-se um clássico e é sempre muito lembrado, percebe
imediatamente a semelhança. Há alguns dias, no entanto, matéria da Folha de São
Paulo registra esse fato, assim como revela muitas outras “coincidências” da
trama de Walcyr com filmes, outras novelas e seriados. Até a bengala do
Dr.House foi parar nas mãos de Mateus Solano, o sensacional Félix.
Tenho certeza de que Walcyr
Carrasco, como todos os outros autores, fazem sim referências a filmes de que
gostam muito, a seriados, novelas, e até mesmo copiem seus próprios textos.
Escrever para uma novela das 9 passou a ser um peso demasiadamente grande para
um autor só, e hoje há uma equipe de “colaboradores” que mergulham na hercúlea
tarefa de criar longos capítulos diários que sejam interessantes, mantenham
sempre um alto grau de suspense, tenham drama misturado com muita ação e
comédia, tenham alta qualidade técnica e ainda passem pelo crivo de
telespectadoras que apontam o que vai bem e o que não vai, pela ótica de donas
de casa, as principais consumidoras do produto. Não é fácil, mas seria ético e
justo copiar sem dar créditos aos autores originais?
Quando tudo está engrenado, gravações
em dia, elenco satisfeito e produção tranquila,
mas a audiência não corresponde à expectativa da emissora, é exigida uma
remexida na trama, que às vezes pode chegar a drásticos cortes no elenco e até
mesmo encurtamento da novela. Como sobreviver a tanta pressão criando somente
coisas originais, sem recorrer a fórmulas já testadas, cópias conscientes ou
não, e até a personagens e histórias paralelas que parecem se repetir
indefinidamente?
Lembrei-me de citar o filme “O
Expresso Da Meia-Noite”, de 1978, para
que os leitores possam fazer uma revisão dele, principalmente os que se lembrem
da cena da novela que citei. Sempre vale a pena rever esse grande sucesso de
Alan Parker, que projetou Brad Davis no cinema, e pelo qual ele ganhou um Globo
de Ouro. Ele teve uma carreira curta, pois morreu de Aids em 1991, pouco antes
de completar 42 anos. Depois de “O Expresso”, pela bela cena que em que Billy Hayes e seu companheiro de cela se
beijam durante um banho na prisão – o
que era muito incomum para a época – especulava-se muito sobre a sexualidade
dele. Quando se noticiou sua morte por AIDS (ele era casado e tinha uma filha),
acentuou-se essa discussão. A AIDS de Davis parecia estar mais ligada ao
consumo de drogas. De qualquer
forma,outro grande momento de sua carreira também o colocava na pele de uma
personagem homossexual, o marinheiro
Querelle, do filme do mesmo nome dirigido por Rainer Werner Fassbinder.
Excelente exemplar da obra do diretor alemão, “Querelle” também é facilmente
encontrado nas locadoras e lojas virtuais.
Vejamos então os filmes de Brad
Davis, tocados pela lembrança provocada pela novela “Amor à Vida”. Depois do
fiasco de “Salve Jorge”, a incrível miscelânea de Glória Perez, a Globo
precisava de um socorro para o seu principal horário, em que o Brasil para
diante da TV. Os sucessos anteriores de Carrasco garantiram que ele alçasse voo
a um dos postos mais cobiçados da televisão brasileira, e ele lá está com sua
colcha de retalhos muito bem costurada para servir pratos diários, requentados
ou não, ao faminto público das novelas. Por muitos meses ainda, vamos nos
divertir com as sensacionais Elizabeth Savalla e Tatá Werneck, Tetê e
Valdirene, respectivamente, com as perversidades cômicas e os “bofes” de Félix
(Mateus Solano), e com as inacreditáveis
histórias que acontecem dentro de um Hospital! Não, não é nada fácil fazer o
equivalente a um filme por dia. As “homenagens” – para não dizer os plágios –
estão perdoadas.