Por José Farid Zaine
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Desde muito cedo o menino andava por uma sala de cinema que era de seu avô, e ficava encantado com os cartazes que anunciavam os filmes que ali seriam exibidos. Quando morou na zona rural, esperava o homem com seu caminhãozinho que vinha para o salão da Igreja de Bom Jesus projetar filmes sobre um lençol...Ali viu as comédias de Mazzaroppi, uma Paixão de Cristo antiquíssima, filmes de Chaplin (agora nas bancas semanalmente, na coleção da Folha de São Paulo), O Gordo e o Magro, e seriados cujos capítulos eram exibidos aos domingos. Que angústia esperar uma semana para ver se a serra ia cortar ao meio a cabeça da mocinha...Mas logo chegou ao seu coração a imagem dos olhos cor de violeta de Elizabeth Taylor, e ele soube o que era o amor de adultos pela história comovente de “A Última Vez que Vi Paris”. Depois, quando foi para o Ginásio (era assim que se chamava o ensino fundamental da época), numa cidade maior, os grandes cinemas eram a melhor e mais acessível diversão. Via de tudo, e se desesperava quando não podia entrar, por causa da censura, que ficava estampada nos cartazes: PROIBIDO ATÉ 14 ANOS, PROIBIDO ATÉ 18 ANOS... chegava a ir às três sessões principais do melhor cinema de sua cidade: sessão zig-zag, às 10 da manhã, matinê às 14h e sarau às 20h ( o momento chique com os filmes mais badalados). Sua mãe ficava preocupada com aquela paixão e chegou a lhe dizer que “só faltava não almoçar e nem jantar mais, e viver de comer filmes...” Na verdade era isso, ele se alimentava daquela arte fascinante que lhe mostrava o mundo em movimento, os dramas, as grandes aventuras, as paixões, a alma humana desnudada.
Ali, nas salas escuras dos cinemas de sua cidade, ele mergulhou na imponência de “Ben-Hur”, de William Wyler, que viria a ser um de seus diretores prediletos, impressionado pela corrida de bigas, emocionado com a trágica e gloriosa história da personagem principal e apaixonado pela assombrosa música de Miklos Rosza, que até hoje considerada por ele uma das melhores trilhas sonoras da história do cinema.
Foi ali que ele se encantou pelo cinema espanhol da época, popularíssimo, e viu todos os filmes de Joselito, principalmente os que mais amou, como “O Rouxinol das Montanhas” e “Saeta”. Ali também conheceu a singela e emocionante história de “Marcelino, Pão e Vinho” com o pequeno Pablito Calvo...e vibrou com a lourinha Marisol em “Um Raio de Luz”. Depois, uma paixão incandescente: Sarita Montiel, com suas canções inesquecíveis em “La Violetera”, “O Último Tango” e “Pecado de Amor”!
Ele quase não podia acreditar em seus olhos, mas o mar se abriu diante dele em “Os Dez Mandamentos”. Era Moisés, com seu cajado, a conduzir o povo para a milagrosa travessia. Era Charlton Heston, com sua imagem poderosa, mais uma vez vivendo um grande herói. Heston, fazendo par com Sophia Loren, seria depois uma de suas personagens favoritas, a de “El Cid” que, mesmo morto, comanda seu exército amarrado a um cavalo, motivando os soldados para a vitória. Lindo!
Uma de suas maiores e mais excitantes experiências foi conhecer os cinemas de São Paulo, que ele sabia que existiam pelos jornais que devorava, colecionando propagandas de filmes famosos. A irmã mais velha lhe deu um dos melhores presentes de sua vida. Ela o levou ao Cine Rivoli, na Capital, para ver “A Noviça Rebelde”. Era um sonho ver aquele filme deslumbrante numa tela enorme, com um som maravilhoso, que ele amou desde a espetacular abertura que jamais deixaria seu imaginário: Julie Andrews, de braços abertos, rodando sobre a relva e cantando “The Sound of Music”... No mesmo ano, outra experiência maravilhosa: “Doutor Jivago”, de David Lean, que pouco tempo depois daria a ele o enorme prazer de conhecer “Lawrence da Arabia” na pele de Peter O´Toole.
Quanto tempo ele ficou cantando as canções de “Amor, Sublime Amor” (West Side Story)? Até hoje, principalmente quando pode ver o musical num teatro de São Paulo, há poucos anos.
Amava tanto os filmes, que começou a escrever sobre eles e a ler muito, muito, sobre essa arte tão completa. E esse mergulho foi lhe revelando os gênios de Fellini, Antonioni, Luchino Visconti, Fassbinder, Herzog, Truffaut, Woody Allen, Walter Salles, Fernando Meirelles, Almodóvar e tantos, tantos outros...
Hoje o menino que comia filmes viu que esse alimento fez bem para sua existência, para sua alma. Agora, depois de muitos anos de vida, dos quais passou tanto tempo dentro dos cinemas, ele escreve num importante jornal de uma grande cidade, e seu prazer é dividir com os leitores os filmes que mais ama...como esses citados, que podem ser vistos na casa de cada um, e podem alimentar uma paixão como a dele, principalmente naqueles que tem o coração como o seu, feito de celuloide!
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