sexta-feira, 19 de julho de 2013

DE ALAN PARKER A WALCYR CARRASCO

Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine

Há algumas semanas, vendo os primeiros capítulos de “Amor à Vida”, de Walcyr Carrasco, a atual novela das 9 da Globo, eu me deparei com uma sequência rigorosamente igual a uma que está no filme “O Expresso da Meia-Noite”(Midnight Express), de Alan Parker. Gosto demais desse filme de 1978. A cena a que eu me refiro é aquela em que Billy Hayes, personagem de Brad Davis, tenta sair da Turquia com pacotes de haxixe na cintura. Ele está com a namorada, e ao perceber a grande quantidade de policiais  prestes a revistarem os passageiros, pede que ela entre no avião e vá embora de qualquer maneira. Na novela “Amor à Vida”,logo no primeiro capítulo, a personagem de Juliano Cazarré, Ninho, namorado de Paloma (Paola Oliveira) faz a mesma coisa. Até a respiração de Brad Davis, numa cena no banheiro do aeroporto de Istambul, é copiada por Cazarré.



Ao ver a cena pensei que o autor estivesse fazendo uma homenagem ao filme, pois a cópia era explícita demais.Qualquer pessoa que tenha visto a obra de Parker, tanto no cinema quanto no DVD, pois tornou-se um clássico e é sempre muito lembrado, percebe imediatamente a semelhança. Há alguns dias, no entanto, matéria da Folha de São Paulo registra esse fato, assim como revela muitas outras “coincidências” da trama de Walcyr com filmes, outras novelas e seriados. Até a bengala do Dr.House foi parar nas mãos de Mateus Solano, o sensacional Félix. 
Tenho certeza de que Walcyr Carrasco, como todos os outros autores, fazem sim referências a filmes de que gostam muito, a seriados, novelas, e até mesmo copiem seus próprios textos. Escrever para uma novela das 9 passou a ser um peso demasiadamente grande para um autor só, e hoje há uma equipe de “colaboradores” que mergulham na hercúlea tarefa de criar longos capítulos diários que sejam interessantes, mantenham sempre um alto grau de suspense, tenham drama misturado com muita ação e comédia, tenham alta qualidade técnica e ainda passem pelo crivo de telespectadoras que apontam o que vai bem e o que não vai, pela ótica de donas de casa, as principais consumidoras do produto. Não é fácil, mas seria ético e justo copiar sem dar créditos aos autores originais?
Quando tudo está engrenado, gravações em dia, elenco satisfeito e produção tranquila,  mas a audiência não corresponde à expectativa da emissora, é exigida uma remexida na trama, que às vezes pode chegar a drásticos cortes no elenco e até mesmo encurtamento da novela. Como sobreviver a tanta pressão criando somente coisas originais, sem recorrer a fórmulas já testadas, cópias conscientes ou não, e até a personagens e histórias paralelas que parecem se repetir indefinidamente?
Lembrei-me de citar o filme “O Expresso Da Meia-Noite”, de 1978,  para que os leitores possam fazer uma revisão dele, principalmente os que se lembrem da cena da novela que citei. Sempre vale a pena rever esse grande sucesso de Alan Parker, que projetou Brad Davis no cinema, e pelo qual ele ganhou um Globo de Ouro. Ele teve uma carreira curta, pois morreu de Aids em 1991, pouco antes de completar 42 anos. Depois de “O Expresso”, pela bela cena que  em que Billy Hayes e seu companheiro de cela se beijam durante um banho na prisão  – o que era muito incomum para a época – especulava-se muito sobre a sexualidade dele. Quando se noticiou sua morte por AIDS (ele era casado e tinha uma filha), acentuou-se essa discussão. A AIDS de Davis parecia estar mais ligada ao consumo de drogas.  De qualquer forma,outro grande momento de sua carreira também o colocava na pele de uma personagem homossexual, o marinheiro  Querelle, do filme do mesmo nome dirigido por Rainer Werner Fassbinder. Excelente exemplar da obra do diretor alemão, “Querelle” também é facilmente encontrado nas locadoras e lojas virtuais.

Vejamos então os filmes de Brad Davis, tocados pela lembrança provocada pela novela “Amor à Vida”. Depois do fiasco de “Salve Jorge”, a incrível miscelânea de Glória Perez, a Globo precisava de um socorro para o seu principal horário, em que o Brasil para diante da TV. Os sucessos anteriores de Carrasco garantiram que ele alçasse voo a um dos postos mais cobiçados da televisão brasileira, e ele lá está com sua colcha de retalhos muito bem costurada para servir pratos diários, requentados ou não, ao faminto público das novelas. Por muitos meses ainda, vamos nos divertir com as sensacionais Elizabeth Savalla e Tatá Werneck, Tetê e Valdirene, respectivamente, com as perversidades cômicas e os “bofes” de Félix (Mateus Solano),  e com as inacreditáveis histórias que acontecem dentro de um Hospital! Não, não é nada fácil fazer o equivalente a um filme por dia. As “homenagens” – para não dizer os plágios – estão perdoadas.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

SÓ OS BONITÕES PODEM SALVAR O MUNDO


Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com

Superman agora é bastante humano, está sempre angustiado pela incompreensão de quem realmente é, de onde veio e qual é sua missão verdadeira. Sua humanidade, contudo, que não exclui os ilimitados poderes, vem com algo de divindade: ele tem trinta e três anos e morrerá, se for preciso, para salvar o mundo. A semelhança com a história mais contada de todos os tempos, não é mera coincidência, embora seja explicitada por um ou outro detalhe que não podem passar desapercebidos.



“ O Homem de Aço” (Man of Steel), que estreia nesta sexta em todo o Brasil após muitas pré-estreias, finalmente traz uma nova face que o público recebe e aceita bem, deixando ficar no passado a imagem de Christopher Reeve, a mais perfeita encarnação do super-herói . O drama pessoal de Reeve, que comoveu o mundo, só aumentou o carinho dos fãs pela imagem que ele fixou nas telas, já que sempre houve uma inevitável comparação entre a personagem –praticamente indestrutível - com o ator exibindo ao mundo sua fragilidade, numa cadeira de rodas, após um acidente que o deixaria tetraplégico e o levaria à morte, após longa e dolorosa luta.
Christopher  Nolan, que imprimiu uma personalíssima visão para Batman em uma trilogia , principalmente em “O Cavaleiro das Trevas”, está presente em “O Homem de Aço” como produtor e roteirista, ao lado de David S. Goyer. É bem visível a participação de Nolan. Já a direção foi delegada para Zack Snyder, sobretudo por seu conhecido talento para filmar lutas. O visual é arrebatador e o filme atende às exigências das plateias contemporâneas, principalmente aquelas formadas pelo público mais jovem, que também prefere ação vertiginosa e barulhenta. E muito barulho é o que não falta nesta  aventura, totalmente em sintonia com a nova geração para contar o início de uma história consumida desde 1938, quando foi publicada em quadrinhos pela primeira vez.
Como divertimento bem acabado, “O Homem de Aço” cumpre plenamente sua função. A escolha de Henry Cavill, ator inglês pouco conhecido até agora, embora tenha feito vários filmes,  resultou perfeita. Ele tem o tipo físico totalmente apropriado para ficar inteiramente à vontade tanto para interpretar  o repórter Clark Kent e seus óculos de aros escuros como para vestir a capa vermelha e o uniforme azul de Kal-El, o  Superman, pela primeira vez sem a sunga por cima. O elenco é ótimo, com um time secundário que é um verdadeiro luxo: Diane Lane e Kevin Costner são os pais adotivos  de Clark  e Russel Crowe é Jor-El, o pai kryptoniano.  Na linha de frente, juntamente com Cavill, temos Amy Adams como Lois Lane  e o excelente Michael Shannon como o General Zod.



A música de Hans Zimmer é brilhante, como sempre, e o conhecidíssimo tema do Superman, de John Williams,  ficou para trás. Os efeitos sonoros e a edição de som são excelentes, embora às vezes o filme fique com certa overdose de barulho. Os efeitos visuais, por sua vez, sempre espetaculares, não raro nos remetem às pirotecnias  tipo “Transformers”, e isso é um ponto fraco da produção.
Com menos malabarismos e explosões está em cartaz outro blockbuster, em que a humanidade também precisa ser salva , só pra variar. No caso, de multidões de zumbis criadas por um vírus. Os mortos-vivos são velozes e querem infectar cada vez mais pessoas. As cenas em que se amontoam como formigas para pular os muros que protegem Jerusalém são fantásticas. O salvador do mundo, nessa sombria ficção, que também anda pelas ruas de Jerusalém, é nada mais nada menos que Brad Pitt. O filme em questão é “Guerra Mundial Z”, dirigido por Marc Forster ( o mesmo de “O Caçador de Pipas” e “Quantum of Solace”), muito bom porque as soluções apresentadas para acabar com a praga dos zumbis são biologicamente aceitáveis.

Como se vê, é um pré-requisito fundamental que o salvador do mundo seja forte e, antes de tudo, bonitão, seja ele um alienígena vindo de Krypton ou um terráqueo corajoso. Os produtores precisam, desde que o cinema foi criado, testar o poder de sedução de suas estrelas. 

sexta-feira, 5 de julho de 2013

ANTES QUE SE FECHEM AS CORTINAS

Por José Farid Zaine
farid.cultura@uol.com.br           
Twitter: @faridzaine
Facebook: faridzaine
Acesse www.faridzaine.com

É certo que a velhice é realmente assustadora, que todos pensam como um dia lidarão com isso na vida. Claro, se a pessoa tiver bastante sorte, ela envelhecerá, pois não envelhecer significa morrer jovem. Portanto, fica claro que a esmagadora maioria da humanidade não deseja morrer cedo...Os avanços da medicina já se fazem notar numa população que fica cada vez mais velha, e a idade avançada pode ser curtida com  mais qualidade. Muito se fala sobre a chamada “melhor idade”, título que muitos adotam e muitos odeiam. O cinema tem se debruçado bastante sobre o tema ultimamente, com bons resultados, que vão da obra-prima “Amor”, de Michael Haneke, um drama contundente, às amenidades de “O Exótico Hotel Marigold”, “E se vivêssemos todos juntos” e a recente comédia romântica “O Quarteto”, dirigida por Dustin Hoffman, em cartaz em várias cidades,  só para citar filmes bem recentes.




Para muitas profissões a chegada da velhice, com a aposentadoria, pode significar um prêmio, a possibilidade de descanso pode vir como uma bênção, e aí podemos citar trabalhadores braçais, operários de diversos ramos de atividades, professores...Mas para os artistas a chegada da velhice é sempre mais complicada. “Deixem-me sozinha”, teria dito Greta Garbo, uma das divas do cinema, recolhendo-se ao seu claustro voluntário para não exibir publicamente a decadência física. No terrível “O Que terá acontecido a Baby Jane?” a coisa é a mais dramática e cruel, pois a personagem vivida por Bette Davis ainda se liga, mesmo com a idade avançada, a um período de sucesso vivido na infância. Como aceitar a passagem do tempo inexorável, que deixa suas marcas impiedosas principalmente no rosto das mulheres que foram lindas? Tentativas desesperadas de preservação da fase áurea da vida podem criar,via cirurgias plásticas, verdadeiros monstros. É certo que a forma com que as pessoas encaram o ocaso da existência varia muito. Muitos atletas poderosos, exemplos de perfeição física, acabam seus dias como instrutores, treinadores, e não se sentem infelizes com a consciência das limitações que o tempo traz à prática do esporte que os consagrou durante a vida.
Pensando nessas questões, o ator Dustin Hoffman, já com 75 anos, produziu e dirigiu “O Quarteto”, sobre um grupo de músicos aposentados que vivem juntos numa “Casa de Repouso” luxuosa, embora prestes a fechar as portas. Eles são representantes principalmente da música erudita, instrumentistas e cantores de ópera. Para eles o envelhecimento é muito mais complicado: As vozes já não alcançam as notas, o fôlego já não é o mesmo, e muitas vezes a audição diminuída pode ser uma perversa contribuição para a piora do quadro geral... “O Quarteto” leva essas questões com leveza e bom humor. A história é ótima, embora completamente inverossímel. Um ótimo elenco se encarrega de garantir o interesse do começo ao fim, e isso é feito na dose certa, pois o filme é enxuto, com cerca de 90 min de duração.
O saboroso desenrolar da trama não nos prepara sustos, nem reviravoltas. O espectador aguarda, naturalmente, que a reunião do quarteto de cantores, com todas as limitações possíveis advindas da idade, com a guerra de egos que nunca tem fim, com um romance requentado, chegue a bom termo. A forma com que Hoffman conduz a trama, ocultando delicadamente as vozes dos quatro cantores quando rolam os ensaios do Rigoletto, de Verdi, é envolvente e chega a comover. O que veremos? Um fiasco provocado pela perda natural do potencial vocal do quarteto? Um sucesso retumbante que coloque velhos e conhecidos astros e estrelas da música lírica sob os holofotes da mídia e aplausos da crítica? A solução é mais do que original e apropriada.
Apesar de todo o elenco ser muito competente, Maggie Smith, naturalmente, rouba a cena. A grande dama do cinema inglês mais uma vez impõe  sua figura extraordinária para compor uma cantora lírica de ego inflado, cheia de recordações dolorosas, e que precisará reavaliar seu comportamento diante dos outros, da velhice e da arte. Smith é muito bem acompanhada por Tom Courteney, Pauline Collins e Billy Connolly.

“O Quarteto” não é uma obra-prima, nem sequer um grande filme. Mas pode ser visto com muito prazer e com muita ternura. Não há amargura no desenrolar da história, e mais uma vez vemos, pelos olhos de um cineasta, que na vida do artista sempre haverá espaço para o brilho antes que se fechem as cortinas!

sexta-feira, 28 de junho de 2013

A CAÇA, poderoso drama que vem da Dinamarca

Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com

Você começa a ver o filme “A Caça”,  e sabe apenas que se trata de um filme dinamarquês dirigido por Thomas Vinterberg, um dos criadores do movimento Dogma, que colocou o cinema da Dinamarca sob os olhares do mundo em 1995. “Festa em Família”,  o melhor filme dele até o lançamento desta obra-prima que é “A Caça” (Jagten),  era uma verdadeira demolição de uma família através de contundentes revelações, que incluíam uma crua exposição de abuso sexual cometido pelo patriarca, que tinha culpa no cartório. Logo no início de “A Caça”, somos apresentados à personagem principal, um monitor de uma escola de educação infantil chamado Lucas. De cara o espectador gosta muito de Lucas, vê seu amor pelas crianças, é informado – pelas discussões que ele tem ao telefone  com a ex-esposa – de que Lucas é pouco ambicioso e quase não tem chances de ficar com a guarda do filho adolescente.



Lucas é interpretado de forma absolutamente brilhante pelo ator Mads Mikkelsen, também presente no representante da Dinamarca no Oscar deste ano, “O Amante da Rainha”,  e mais conhecido pelo papel de vilão – irrepreensível – que desempenhou em “007 – Cassino Royale”. Por sua atuação como o simples e sensível monitor de “A Caça”, Mikkelsen  ganhou o prêmio de melhor ator em Cannes. É um justíssimo reconhecimento internacional por um trabalho soberbo, que o coloca entre os melhores atores do mundo de sua geração.
Neste filme o espectador é imediatamente também apresentado a uma outra personagem fascinante: a pequena Klara, de pouco mais de 5 anos,aluna da escolinha e que adora Lucas. Ela é filha do melhor amigo dele, e muitas vezes, por ter confiança total desse amigo,  é ele quem leva a menina para casa. A família de Klara é cheia de problemas, e ela tem hábitos de sair de casa sem ser notada, daí ficar perdida e precisar de Lucas. A menina deseja demonstrar seu amor ao Professor e lhe dá um presente. Lucas o recusa delicadamente, mas a rejeição fará com que Klara pense em castigá-lo, com as armas que pode ter em seu universo infantil. A esta altura, o espectador está completamente inserido na pele de Lucas, e passa a viver os sentimentos dele. Klara, uma lourinha angelical de olhares enigmáticos,vivida com categoria profissional pela garota Annika Wedderkopp, inventa para a diretora da escola que Lucas a teria molestado sexualmente, pois teria mostrado seu pênis a ela dentro da escola. Um ato abominável, um crime hediondo, uma coisa horrível, portanto,que não permitiria outra coisa senão condenar imediatamente, sem questionamentos, o asqueroso monitor. Desde esse momento, sabemos que é uma mentira da menina, e começa, juntamente com o sofrimento da personagem,Lucas, nossa angústia. O que pode uma declaração desse tipo causar numa diretora de escola que diz que as crianças não mentem jamais? Um tipo de cegueira irracional, que logo é compartilhada pelo assistente social,e que se alastra rapidamente entre os pais dos alunos e famílias que compõem a comunidade. Estamos falando de uma pequena cidade do interior da Dinamarca, onde todos se conhecem, onde todos os adultos compartilham as mesmas brincadeiras, as mesmas comemorações, os mesmos hábitos. A indignação do espectador só cresce e se transforma num incômodo nó no estômago,que ele não tem como combater, assim como Lucas. Acuado, como os cervos que são caçados por esporte na comunidade, ele apenas pode se ver desprezado, combatido e odiado, tentando se manter em pé com dignidade, pela plena consciência de sua inocência. A polícia, é claro, não consegue mantê-lo preso, porque não há provas contra ele. Mas para a comunidade, que encontrou um bode expiatório, nada há a fazer também senão despejar sobre ele a irracionalidade do seu desejo de que alguém pague por uma culpa desenhada com as cores do ódio coletivo.
Temos visto, e não raramente, o cinema tratar da mentira e do pré-julgamento, e com isso produzir filmes magníficos. Vale a pena rever o extraordinário drama de Wylliam Wyler “Infâmia” (The Children´s Hour), com antológicas interpretações  de Shirley Maclaine e Audrey Hepburn. Aí uma aluna maldosa faz um comentário venenoso, e duas mulheres tem suas vidas reviradas. Mas a “infâmia” proferida pela menina tinha no fundo uma dolorosa verdade, que era ocultada com grande sofrimento. Em “A Caça”, o diretor Vinterberg imediatamente trata de mostrar que Lucas é inocente, por isso não importa que eu esteja aqui contando a história. Não basta saber o roteiro, o resumo,a sinopse, para que se saiba do que realmente trata “A Caça”. É preciso vê-lo e  entrando completamente na pele de Lucas, sofrendo com ele cada segundo de seu calvário provocado pelo poder nefasto do pré-julgamento. 

E com o final atordoante do filme – terrível por sua ambiguidade - voltamos ao nosso cotidiano, mais convictos de que nossas vidas, de repente, podem ser remetidas ao inferno nas asas de uma mentira.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Sobre desejos e segredos sem fim

Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com


De tempos em tempos surge um filme que marca profundamente pela originalidade, pela inventividade e pelo arejamento que consegue dar à arte cinematográfica, provando que o talento nunca deixará de existir para que surjam obras que independam de orçamentos milionários e pirotecnias tecnológicas.
Vem da França um exemplo desses filmes geniais e perturbadores, que tornam ainda mais apaixonante o hábito de ir ao cinema: trata-se de “Dentro da Casa” (Dans La Maison), do diretor François Ozon, que se afirma como um dos melhores diretores europeus da atualidade.
“Dentro da Casa” nos introduz ao universo do Professor Germain (Fabrice Luchini), que dá aulas de francês numa escola de ensino médio. Ele divide com a mulher, Jeanne (Kristin Scott Thomas), a decepção diante do quadro apresentado por seus alunos: mediocridade e desinteresse.



A desilusão do professor Germain sofre um abalo apenas quando entra em cena o aluno Claude (Ernst Umhauer). Ao pedir que os alunos descrevam um fim de semana, Germain sofre com as bobagens e coisas vazias que os estudantes colocam em suas redações, mas se surpreende com o trabalho de Claude: ele conta com riqueza de detalhes sua entrada na casa de um amigo a quem vai ensinar matemática, revelando que sempre teve o desejo de estar lá. Fala de Rapha, o colega de classe, o Rapha pai e Esther, a mãe, de quem diz sentir “cheiro de mulher de classe média”, o que pode ser  elogioso ou não. No fim de sua redação, Claude coloca “continua”, o que mexe com o professor, finalmente excitado pela descoberta de um aluno com grandes possibilidades de se tornar um escritor. Ele passa a incentivar Claude nessa aventura de permanecer na casa do amigo, como se fosse vital a continuidade de um enredo cada vez mais intrigante e a chegada a um final que não desse margem para um “continua”...
Desde o seu início até o final surpreendente, “Dentro da Casa”nos envolve na sua atmosfera de voyeurismo imposta por Claude e assimilada por Germain. Nossa imaginação e nosso desejo de ver a trama desenrolada constroem um outro livro ou um outro filme,em que colocamos nossos próprios olhos, nossos desejos e nossas próprias frustrações.
O voyeurismo explorado por Ozon não é o mesmo celebrizado por Hitchcock em “Janela Indiscreta” (Rear Window), com Grace Kelly e James Stewart. O cérebro  de “detetive forçado” de Stewart, um fotógrafo profissional preso em seu apartamento por causa de uma fratura na perna,  interpretava o que via com os próprios olhos ou com as lentes de sua câmara, de longe, como intuito de desvendar um crime que sua imaginação concebera, e que Hitchcock, com sua habilidade costumeira ia criando na mente do espectador. Aqui vemos o que Claude  revela em suas minuciosas observações, não de longe, porque ele está dentro da casa, e seu interesse não é desvendar crimes ou mistérios.
O novo filme do diretor de “8 Mulheres” é uma joia rara que chega aos cinemas depois de passar por muitos festivais, como o do Rio, em 2012. Por aqui será preciso aguardar  o lançamento em DVD. Vale a pena anotar e esperar.
Com “Dentro da Casa”o espectador se apropria dos olhos de Claude e dos sentimentos de Germain para acompanhar, sempre com enorme interesse, os rumos tomados pela história até o seu desfecho. O filme acaba, mas em nossos corações e mentes persiste a elaboração do roteiro de uma continuação.

No cinema e na literatura os desejos e os segredos nunca terão fim. Mas sempre haverá novos olhares que nos guiarão para dentro deles.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

SANGUE NOVO NA JORNADA NAS ESTRELAS

Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com

“ Espaço: a fronteira final. Estas são as viagens da nave estelar Enterprise... Em sua missão de cinco anos... para explorar novos mundos... para pesquisar novas vidas... novas civilizações... audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve”... Com esse texto, um narrador  abria solenemente os episódios semanais de “Jornada nas Estrelas”, série surgida nos anos 1960, que quase não passou da primeira temporada nos EUA por falta de audiência. Depois de permanecer até uma terceira temporada uma legião de fãs no mundo todo não deixou que a série ficasse fora da TV. Daí para a franquia no cinema, era um passo inevitável. E depois de mais de uma dezena de filmes de sucesso, chega às salas o segundo exemplar dirigido por J.J. Abrams. Os saudosistas não terão do que reclamar, pois o filme só valoriza a história e as personagens, criando uma imagem moderna, ágil e belíssima para as aventuras da célebre nave e sua simpática tripulação. Mesmo os bem  jovens, que não viram nada do início da saga espacial ou tiveram acesso apenas ao que está disponível na internet, terão motivos de sobra para gostar.   



“Além da escuridão - Star Trek” tem todos os elementos necessários ao sucesso dos blockbusters:  o roteiro é bem amarrado, a história é interessante, os efeitos especiais são abundantes e de primeiríssima qualidade, direção de arte e fotografia são acompanhados de ótima trilha sonora (a cargo de Michael Giacchino)...e apesar do filme não ter sido originalmente filmado em 3D, a transposição para essa tecnologia trouxe um brilho extra para as qualidades visuais. A edição de som também é espetacular.
Não é só pelas qualidades técnicas, contudo, que sobrevive e se segura com dignidade essa nova aventura dirigida pelo competente Abrams, o renovador da série a partir de 2009. O elenco é excelente e traz um vigor novo para personagens tão conhecidas e adoradas pelo público: Chris Pine cai como uma luva para o Capitão Kirk; ele não é apenas o astro bonitão que é usado para chamariz, mas um bom ator de verdade. Zachary Quinto também ficou ótimo como Mr. Spock, firmando-se como o herdeiro de Leonard Nimoy, cuja breve aparição é apenas uma das citações e homenagens que estão por todo o  filme. Zoe Saldana ( a mulher azul de Avatar) também vai bem, para garantir o lado feminino, embora o caso com Spock seja mais cômico que romântico. A introdução de uma nova personagem, vivida pela bela Alice Eve, como Carol, nada acrescenta, mas também não atrapalha. A cena em que ela fica de calcinha e sutiã, sugerindo que vem aí um possível namoro com o Cap. Kirk, foi muito criticada, mas não tem relevância, nem compromete o filme.
Quem rouba a cena, entretanto, é o vilão. Não há aventura do gênero que se segure sem um bom vilão. Não ficaram boas lembranças de Eric Bana, do exemplar de 2009, então J.J.Abrams recorreu ao  excelente ator  britânico Benedict Cumberbatch para compor o terrorista John Harrison. Ele está perfeito, com seu olhar gélido e a voz profunda, além do rosto quase ebúrneo que lhe dá um aspecto meio fantasmagórico, mais do que maquiavélico.
Em “Além da Escuridão- Star Trek” não estamos apenas em uma ficção científica futurista, apesar dos cenários e do ano em que se passa a ação. Na história temos um atentado terrorista, a procura obstinada pelo autor e um misto de violência e desejo de vingança. O ataque a uma biblioteca no centro de Londres não é mera coincidência que tenha semelhança com o 11 de setembro em Nova York, e depois com a caça a Bin Laden ou o sentimento que dominou a nação americana após o trágico acontecimento.
“Star Trek” valoriza o nome de J.J. Abrams, que será o responsável pela direção da continuação de uma das franquias mais bem-sucedidas da história do cinema, “Star  Wars”. Com certeza sua ousadia e seu domínio sobre o ritmo frenético de aventuras espaciais garantiram sua escolha.
Depois de várias pré-estreias por todo o Brasil na semana passada e nesta, o novo “Star Trek” está chegando ao circuito normal para ocupar centenas de salas. O filme tem um início frenético, marcado por imagens e cores impressionantes, além da música poderosa e envolvente. O espectador é “agarrado” nas primeiras sequências e o ritmo permanece durante as mais de duas horas que se sucedem, sendo amenizado pelo humor quase sempre presente em afiados e inteligentes diálogos. Estamos falando, obviamente, de um ótimo divertimento, embora nada mais que o prometido.

O novo filme, assim como o anterior, abandonam o nome “Jornada nas Estrelas” para que se fixe o título “Star Trek”, sem tradução. Nada tira, contudo, a ligação umbilical com a história original, concebida para a TV em uma produção modestíssima, se comparada com a atual versão para a tela grande, que consumiu mais de 180 milhões de dólares. Essa soma, sem dúvida, voltará em dobro brevemente para os cofres dos estúdios. Sucesso quase tão veloz quanto  a Enterprise “entrando em dobra” em busca do espaço, a fronteira final!

sexta-feira, 24 de maio de 2013

OS INFERNOS DE DAN BROWN E KHALED HOSSEINI


Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com

Dan Brown e Khaled Hosseini transformaram-se naqueles tipos raros de escritores cujas obras, antes mesmo de serem escritas, causam furor no mercado editorial e deixam “acesos” produtores cinematográficos. Nesta semana chegaram às livrarias do Brasil os dois mais recentes candidatos dos dois autores a permanecerem na lista dos mais vendidos por incontáveis semanas. Já se prevê que as tiragens iniciais para “Inferno”, de Dan Brown, e “O Silêncio das Montanhas”, de Khaled Hosseini, gigantescas para os padrões brasileiros (500.000 exemplares e 300.000, respectivamente) sejam rapidamente consumidas.
O primeiro capítulo de “Inferno” está disponível na internet. Impossível ler e não querer continuar. Brown tem a capacidade de “amarrar” o leitor já nos primeiros parágrafos, para não dizer nas primeiras páginas. Essa capacidade de contar uma história a partir de um ponto de extremo interesse e só fazer com que esse interesse se mantenha e aumente por centenas de páginas, não é para muitos...E foi assim que “O Código Da Vinci” se transformou num monumental best-seller internacional, ao mesmo tempo em que milhões de leitores ficaram aguardando o lançamento do filme baseado no romance. Desde a escalação do elenco, escolha de diretor e técnicos, tudo gerou notícia e expectativa. Talvez por isso mesmo o filme de Ron Howard, com Tom Hanks encarnando Robert Langdom com um horrendo penteado, e Audrey Tautou interpretando Sophie Neveu, não tenha agradado nem feito o furor que se esperava, muito longe do que o que fora causado pelo livro. O mesmo aconteceu com “Anjos e Demônios”, sucesso de vendas nas livrarias e uma certa decepção com a adaptação para o cinema, também dirigida por Ron Howard.



Que destino terá nas telas o “Inferno” concebido por Dan Brown, e que nos traz o professor de Simbologia Robert Langdom numa história inusitada que faz referência a outro inferno, muito mais famoso, o de Dante ? Quantos novos leitores serão atraídos? E o cinema, fará jus desta vez às intrincadas aventuras do pesquisador? Enquanto não temos como conferir este “Inferno” nas telas, fiquemos com uma revisão das principais adaptações dos sucessos do autor, disponíveis em DVD.
E Khaled Hosseini? O inferno dele seria o próprio país natal, o Afeganistão, com todo o sofrimento causado pela guerra e pelo terrorismo. O extraordinário sucesso de “O Caçador de Pipas” conduziu milhões de leitores para uma viagem emocionante a um país belo e exótico, dilacerado por bombas e invasões. Uma história belíssima e muito bem contada só poderia resultar num grande filme, mas não foi o que aconteceu. Não que “O Caçador de Pipas”, dirigido por Mark Forster seja ruim, longe disso. É um bom filme, que se vê com muito interesse, embora a inevitável comparação com o romance seja desfavorável ao que se vê no cinema. Hora de rever a obra em DVD, enquanto lemos “O Silêncio das Montanhas”, belo título do novo livro e que deverá render outro filme para muito breve.
Qual será a imagem que um filme baseado no novo livro de Dan Brown fixará em nossas mentes? Será semelhante àquela que nossa imaginação criar pela leitura inevitável do sucesso que se anuncia? Um exercício interessante será buscarmos, na nossa memória cinematográfica, a visão do cinema sobre o inferno, não necessariamente aquele concebido por Dante em “A Divina Comédia”, ou por John Milton, no seu “Paraíso Perdido”. Além de labaredas e fornalhas queimando os pecadores pela eternidade, o inferno bem poderia ser considerado algo como a terra minada do Afeganistão de Hosseini, mutilando corpos, como vimos em “A Caminho de Kandahar” ou como os campos de concentração de “A Lista de Schindler” e tantos outros tenebrosos registros sobre o Holocausto.

Fiquemos, nesta semana, com a leitura de “Inferno”, de Dan Brown, e “O Silêncio das Montanhas”, de Khaled Hosseini, e anteciparemos, através da imaginação, como serão os blockbusters gerados por eles.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Terror e comédia...é o que temos para hoje!


Por José Farid Zaine
farid.cultura@uol.com.br
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse: www.faridzaine.com

“O Último Exorcismo – Parte 2” já deixa claro que este não é o último, porque evidencia a vinda da Parte III, Parte IV, etc...Eu gosto de filmes de terror, filmes de suspense, mas os que não se valem de sustos fáceis, sequências sanguinolentas e monstros explícitos, gosmentos...O cinema está cheio de exemplos de magníficos filmes capazes de nos encher de pavor e angústia, muitas vezes sem mesmo usar efeitos especiais exagerados, como nas obras-primas “O Bebê de Rosemary”, de Roman Polanski, e “Os Inocentes”, de Jack Clayton. Quando a coisa é muito “carnavalesca”, muitas vezes o humor resolve as situações, como em “Arraste-me para o Inferno”, ótimo exemplar do gênero dirigido com competência por Sam Raimi.
Quem estava à espera de um filme assustador, desses que nos acompanham depois de terminada a sessão, pode esquecer. “O Último Exorcismo – Parte 2” abandona o que o primeiro tinha de mais original, sua pretensão de parecer documental, um pouco à moda de “A Bruxa de Blair”. Mas aqui a história se volta para a pura e recatada adolescente Nell (Ashley Bell), vinda de uma terrível experiência de possessão demoníaca. Ela surge agora em uma outra cidade, no interior, tentando tocar a sua vida. Não se lembra muito do que lhe aconteceu antes, arruma um emprego num Hotel, e passa a morar com outras meninas. Essas fofocam  abertamente sobre suas experiências sexuais.



Em “O Último Exorcismo – Parte 2” o  sexo, aliás, passa a falar muito alto na vida de Nell, ela até arruma um namorado, Chris, e chega a se excitar ouvindo um casal transando, com o ouvido colado à parede do quarto do hotel que está arrumando...E como para um demônio que se preze distância não é problema, o esperto “Abalam” irá encontrar a moça. Agora ele vem ainda mais sedento, e deixa claro que está interessado em possuir o corpo dela, pelo qual ficou apaixonado... Com um resumo desses, é de se imaginar que o filme seja totalmente ridículo. É quase. Não fosse por algumas sequências interessantes (como a que faz uma clara citação a “Os Pássaros”, de Hitchcock) e pela interpretação convincente de Ashley Bell, não daria pra engolir este que não será o último exorcismo, com certeza.

ESTREIAS
Estas são algumas estreias de hoje nos cinemas brasileiros:
 A Expedição Kon-Tiki  (Kon-Tiki, Reino Unido/Noruega/Dinamarca, 2012), de Joachim Rønning e Espen Sandberg . Trata-se de uma aventura baseada na vida do explorador Thor Heyerdal, que percorreu milhas no Oceano Pacífico em uma balsa. O filme foi finalista do Oscar 2013, representando a Noruega, mas perdeu para “Amor”, de Michael Haneke.

Finalmente 18! (21 and Over, EUA, 2012), de Jon Lucas e Scott Moore . Mais uma comédia americana destinada ao público adolescente, que certamente irá muito bem nas bilheterias.

Giovanni Improtta (Brasil, 2011), que José Wilker interpreta e dirige. A personagem criada por Agnaldo Silva para a novela “A Senhora do Destino”, e que fez grande sucesso, ganha agora vida própria nesta nova comédia brasileira que tem tudo para se tornar muito popular.



O massacre da serra elétrica 3D – A lenda continua (EUA, Texas Chainsaw 3D, 2013), de John Luessenhop . Para quem esperava um terror sanguinolento, este é o caso. Mais uma edição da série, agora com o sangue jorrando em 3D, deve agradar pelos exageros assumidos e temperados com muito humor negro!

...e enquanto isso, na TV, hoje temos o final de “Salve Jorge”, a novela de Glória Perez que começou muito mal no Ibope, mas que chegou a marcar significativos recordes de audiência nas últimas semanas. A autora é extremamente experiente, e foi capaz de mexer em sua trama rocambolesca, conquistando o interesse do público. E fez de Giovanna Antonelli a grande personagem da trama, como a bela e implacável delegada Helô. Terror e comédia também habitaram nossas casas via “Salve Jorge”. Istambul foi aqui por mais de seis meses.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

STREETS OF BRASILIA

Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse: www.faridzaine.com


É difícil passar  pelas ruas de Brasília sem se lembrar da ditadura militar, que durou de 1964 a 1985. A cidade, oficialmente nascida em 1960, mal respirara os ares da democracia no planalto central, quando se transformou em sede de sucessivos governos militares, tendo sua imagem colada à ditadura, à falta de liberdade de expressão, aos atos institucionais que amordaçaram o cidadão brasileiro. Uma censura estúpida, contudo, ao invés de calar nossos artistas, estimulou a criação e, como em nenhum outro período, a inquietação, a revolta e a indignação produziram  um enorme volume de produções culturais, artísticas e intelectuais que marcariam para sempre a nossa História.



Quando um garoto nascido no Rio, no mesmo ano da inauguração  de Brasília, mudou-se para a nova capital aos 13 anos,  a ditadura militar recrudescia, assim como o desejo de mudar essa situação incendiava o coração dos jovens. Ele se chamava Renato Manfredini, tinha uma sólida família, podia estudar...Quando teve uma doença óssea e precisou ficar cerca de seis meses numa cama, preencheu sua mente e seu coração com música, muita música. Ao se recuperar, seu destino estava traçado . A cidade era Brasília, era preciso fazer alguma coisa. Era preciso arrancar vida daquela arquitetura que o mundo todo admirava e celebrava. A cidade era seca, tal qual o ar  que a envolvia. Então eles vieram, os garotos com suas guitarras, com seus versos inflamados que traduziam tudo o que uma geração queria dizer. Intérprete dessa geração, Renato criou canções explosivas, românticas, políticas, verdadeiras.

O filme de Antonio Carlos Fontoura, “Somos tão jovens”, que estreou na semana passada em todo o País, nos leva a Brasília dos anos 1980, quando Renato e seus amigos, primeiramente como Aborto Elétrico, depois como Legião Urbana, mudaram a trilha sonora da Capital e a levaram para todos os cantos. Fontoura poderia ficar muito mais livre, levado mais tempo pela música da Legião do que pelo roteiro esquemático de Marcos Bernstein. Contudo, ele consegue nos fazer mergulhar no tempo e na cidade, mais por nos permitir cantar todas as músicas do que por nos fazer matar a curiosidade sobre a vida do cantor antes da fama. O interesse por Renato, a pessoa, vem do seu intérprete, o ator Thiago Mendonça. Ele manda bem  como o irrequieto, dramático e arrogante compositor, é bem parecido com ele, embora mais bonito. A princípio, a atuação poderia parecer esquemática demais, no caso de um espectador não ter visto ou não ter se lembrado das aparições de Renato, facilmente encontradas na internet. Entretanto, se o esquematismo vale para Thiago, não funciona para os outros. De seus jovens companheiros de elenco, salva-se a intérprete de Aninha, Laila Zaid. A amiga de Renato ganha grande espaço na trama, a ponto de mascarar o comportamento do cantor, sendo que seu envolvimento com drogas e sua homossexualidade ocupam um plano discreto e delicado demais. Enfim, uma obra que se diz “filme de ficção baseado na vida de Renato Russo”, pode criar personagens e maquiar algumas sem se comprometer.



“Somos tão jovens” não é um grande filme, mas é interessante, principalmente pelo seu clima nostálgico e pelas canções que permanecem vivas e atuais, e faz com que a plateia deseje cantá-las, como se estivesse num show da Legião. E, apesar do tom nostálgico, é um filme alegre. Quem esperava uma biografia completa do cantor e compositor, cobrindo toda sua vida e sua carreira, até o fim tão triste, ficará decepcionado. Há boatos de um segundo filme, completando a biografia. Essa continuação, se acontecer, não poderá omitir o sucesso imenso no Brasil e no mundo das canções de Renato, nem a sua prolongada e dolorosa enfermidade, num tempo em que a Aids era sentença de morte, essa morte iminente que ele sentia e que fez nascer a lancinante “A Via Láctea”, do último disco, “A Tempestade”.

Sim, impossível andar pelas ruas de Brasília sem se lembrar de Renato Russo, sem cantar algum sucesso da Legião Urbana. “Somos tão Jovens” é bem isso: um bilhete para percorrermos a cidade e compreendê-la como berço de um já histórico movimento musical. Pena que nos lembremos também do fim trágico de uma vida tão produtiva. Bruce Springsteen, se passasse pela nossa capital ouvindo a voz do trovador cantando “Por Enquanto”, talvez trocasse sua comovente “Streets of Philadelphia” por “Streets of Brasilia”...

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Homem de Ferro...mas não muito!


Por José farid Zaine
farid.cultura@uol.com.br           
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com

A primeira sensação que temos, com as primeiras sequências de “Homem de Ferro 3”, que estreou na semana passada em 1223 ( recorde absoluto, superando “Amanhecer –Parte 2”) salas brasileiras, é a de que já vimos este filme. O trailer, bombardeado sobre os espectadores de nossos cinemas há pelo menos um ano, é um dos responsáveis por essa sensação... Contudo, e ainda bem, logo nos deparamos com um divertimento de primeira, muito bem feito, envolvente, ágil, e parecendo justificar o seu orçamento milionário.
“Homem de Ferro 3” é o melhor da série, creditando-se essa qualidade toda principalmente à direção de Shane Black. Robert Downey Jr. carrega o filme, como sempre, mas neste terceiro exemplar ele parece muito mais à vontade, explorando a ironia, o humor e a fragilidade humana. Não por acaso, ele passa muito tempo sem seu famosíssimo traje, e seu lado humano tem destaque. São divertidos seus ataques de pânico e seus diálogos afiados, produtos de um roteiro bem costurado. É interessante ver o super-heroi despojado, sofrendo e apanhando como um mortal comum, já que o que lhe dá poderes é a alta tecnologia do seu traje. Os trajes, por sua vez, ganham vida e garantem algumas das mais movimentadas cenas.



Há sequências espetaculares em “Homem de Ferro 3”, como a destruição da casa de Tony Stark, e o salvamento de 11 pessoas ejetadas do avião presidencial durante um ataque dos vilões.
O que se espera de um blockbuster exaustivamente anunciado e que consumiu milhões de dólares em sua produção? Diversão, naturalmente. E nisso o filme não decepciona, cumprindo  muito bem a sua função.
E vejam, quem, obviamente, é a companhia digamos, oficial, de Robert Downey Jr: é a loura mais comentada da semana no quesito “celebridade”, Gwyneth Paltrow, a intérprete de Pepper Potts. Ela conseguiu a proeza de ser eleita a mais bela do mundo pela revista People, e a mais odiada personalidade pela revista Star. Esse antagonismo estranho veio de duas coisas bem conhecidas sobre a atriz premiada com o Oscar em “Shakespeare Apaixonado”: sua decantada beleza e seu comentado “gênio forte”...
Outra companhia para Downey Jr. é a de Guy Pierce, como o vilão do momento, o cientista Aldrich Killian.
Importa muito a história, quando se trata de mais uma aventura de um super-heroi? Nem tanto. Importa mais a forma com que essa aventura será saboreada, quantos efeitos visuais inovadores surgirão, e quanto o mocinho e a mocinha deverão sofrer até que os vilões sejam devidamente reduzidos a pó. Isso vale desde que o cinema foi criado.
Em “Homem de Ferro 3” há que se fazer justiça à escalação do elenco, excelente. Além dos três principais, temos a presença de Don Cheadle, ótimo ator consagrado pelo belo e contundente “Hotel Ruanda”, pelo qual foi indicado ao Oscar de melhor ator. E como o estranho e interessantíssimo Mandarim, nada mais, nada menos que Ben Kingsley, irreconhecível, mas sempre um grande ator. Sim, Kingsley é o intérprete de Gandhi, papel que lhe deu o Oscar de melhor ator no filme homônimo dirigido por Richard Attenborough , e que ganhou também como Melhor Filme (1983).
Bem, já que temos um programa divertido pela frente, vamos curtir essa aventura  legal, prova de que existe vida inteligente no tratamento aos super-herois. E para aproveitá-la inteiramente, procuremos uma boa sala, com projeção em 3D e som muito, muito bom. Aí dá até pra encarar o cheiro de manteiga das pipocas e os adolescentes barulhentos...

sexta-feira, 26 de abril de 2013

LÁGRIMA E ESQUECIMENTO



Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com

A LÁGRIMA

No final dos anos 1960, um escritor que tentava há tempos o sucesso, alcançou-o de uma forma que talvez nem ele esperasse...”Rosinha, Minha Canoa”, lançado em 1962,  foi uma febre e abriu-lhe as portas para a vitória no difícil mercado editorial brasileiro. Falo de José Mauro de Vasconcelos, que já havia publicado  antes”Banana Brava”, “Barro Blanco”, “Arara Vermelha”, “Doidão” e “Confissões de Frei Abóbora”, entre outros . Se “Rosinha” foi bem nas vendas, o estouro veio com “O Meu Pé de Laranja Lima”, em 1968, sucesso instantâneo e que se transformou num dos livros brasileiros mais lidos e traduzidos de todos os tempos.
A história da infância de um menino, Zezé, que tinha “o diabo no corpo”, por conta de suas incansáveis travessuras, que apanhava do pai bêbado a quem tentava ajudar, que fez amizade com um homem bem adulto, a quem chamava “Portuga”, que conversava com um pé de laranja-lima no quintal de sua casa pobre, comoveu milhares de leitores e, como não poderia deixar de ser,no caso de ter se transformado num best-seller, foi logo adaptado para o cinema e para a TV. Em 1970 surgiu a primeira versão para o cinema, dirigida por Aurélio Teixeira. Virou novela na extinta TV Tupi, também em 1970, e recebeu novas adaptações para folhetins da Bandeirantes em 1980 e 1998. A novela da Tupi , escrita por Ivani Ribeiro, tinha Eva Wilma e Nicette Bruno no elenco. Dionísio Azevedo estava na versão de 1980 da Bandeirantes, e Gianfrancesco Guarnieri na de 1998, adaptada por Ana Maria Moretzsohn.
A nova versão para a tela grande  concluída  em 2012 e que chegou aos cinemas neste abril de 2013 gerou muitas expectativas positivas. Não era para menos: o roteiro foi escrito por Marcos Bernstein, que dirige o filme e  que fez o roteiro do maravilhoso “Central do Brasil”; o elenco contou com José de Abreu, experiente ator vindo do recente megasucesso da TV “Avenida Brasil”, e que aqui aparece com um estranho sotaque que vai e volta;  a figura principal do romance, o menino Zezé, foi interpretado pelo filho do cantor Leonardo, o talentoso e simpático garoto João Guilherme Ávila;  o popular ator da novela “Salve Jorge” e outros sucessos da Globo, Caco Ciocler, fez Zezé adulto...some-se a isso tudo uma ótima fotografia, uma linda trilha sonora, e teremos um excelente filme, certo? Errado. O atual “Meu Pé de Laranja Lima” é como aqueles bolos com ótimos ingredientes, mas que “desanda” ao se preparar a receita, na linguagem das donas de casa. Dá pra comer esse bolo, mas falta um recheio mais saboroso. Adoraria dizer que a obra de Marcos Bernstein faz jus ao seu talento,  é um filme maravilhoso, que fará bonito no mercado interno e internacional, mas não dá para tanto. Mas quem sabe caia no gosto do público e arraste multidões ao cinema, o que parece atualmente acontecer apenas com comédias do tipo “Vai que Dá Certo”...



O ESQUECIMENTO
Não foi só o cinema brasileiro que nos deu um daqueles filmes cheios de boas intenções, como este “Meu Pé de Laranja Lima”, nas últimas semanas. Veio dos EUA mais um blockbuster estrelado por Tom Cruise e Olga Kurylenko , dirigido por Joseph Kosinski, o longa de ficção científica “OBLIVION”, outro exemplar de um gênero difícil e que jamais parece esgotar o tema da Terra destruída e dominada por alienígenas. “OBLIVION”, que significa “esquecimento”, no sentido de apagamento total da memória original de um indivíduo, tem as qualidades do gênero: direção de arte inovadora e competente, música apropriada, fotografia perfeita, efeitos visuais e sonoros de ótima qualidade, o onipresente Morgan Freeman no elenco... entretanto um roteiro com surpresas e reviravoltas nem sempre interessantes conduz o espectador até o final, mas só até aí. Depois é o esquecimento.
Fiquemos assim: num período de fracos lançamentos no cinema dá para gastar uma lágrima com “Meu Pé de Laranja Lima” e tentar acreditar que Tom Cruise é o salvador do Planeta.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

CINEMA PARA AMOLECER CORAÇÕES

Por José Farid Zaine
Twittter: @faridzaine
Facebook: farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com

Em tempos de discussões acirradas sobre a conveniência da permanência do Deputado Marco Feliciano como Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em virtude de suas desastrosas declarações que tem provocado espanto e indignação em todo o País, voltemo-nos um pouco para os filmes que tratam de preconceitos raciais e sexuais, para vermos que o cinema nunca abandonou esses temas, e que eles são bem antigos...Desde que existe a civilização é impossível relatar o quanto seres humanos, sempre iguais desde a Criação, sofreram e morreram por serem diferentes da maioria, ou por não se submeterem a regras absurdas de sociedades ou religiões que desejam manipular os cidadãos, tirando-lhes a liberdade de escolha e de expressão.
Vejamos o caso do preconceito racial. Olhando hoje para os Estados Unidos, onde um negro é Presidente da República, e por consequência desse cargo ele pode ser considerado o homem mais poderoso do Planeta, e voltemo-nos  para um passado nem tão remoto, nesse mesmo país,  onde negros simplesmente eram considerados seres menores, obrigados a viver sob regras desumanamente segregadoras, que os transformavam em párias da sociedade. Foram necessárias décadas de sofrimento para que o “sonho” de Martin Luther King se materializasse e hoje um extraordinário avanço se transformasse em realidade. A luz amarela, contudo, precisa ficar sempre acesa, para que qualquer ameaça de retrocesso seja imediatamente rechaçada. Comparemos o cenário de “Imitação da Vida” (Imitation of Life), lindo melodrama de Douglas Sirk, com a atualidade. Nesse filme, a história de uma mulher branca (Lana Turner) que faz sucesso ajudada por sua criada negra (Juanita Moore), o lado mais cruel do racismo é mostrado: a filha, branca, renega a própria mãe, negra. A cena em que Mahalia Jackson canta um spiritual no velório da mãe negra é emblemática e comovente, e é capaz de derreter o mais gelado dos corações... Criadas negras quase escravizadas foram retratadas no recente “Histórias Cruzadas” (The Help), com um elenco fabuloso de grandes atrizes negras como Viola Davis, indicada ao Oscar de melhor atriz  e Octavia Spencer, vencedora como atriz coadjuvante.
Uma revisão necessária vale também para  o belíssimo “O Sol é Para Todos” (To Kill a Mockinbird), de Robert Mulligan, de 1962, em que uma mulher branca acusa um homem negro de estupro, sendo ele claramente inocente, mas antecipadamente condenado por uma sociedade medíocre e racista, numa pequena cidade sulista dos EUA nos anos da depressão. Gregory Peck, magnífico como o advogado que enfrenta tudo para defender o negro, ganhou o Oscar de melhor ator, merecidíssimo.
Mas não apenas o sofrimento dos negros, por conta da cor da pele, deu tema a grandes filmes. Spielberg, que fez  “A Cor Púrpura” e lançou Whoopi Goldberg ao estrelado, debruçou-se sobre o holocausto e daí tirou um drama cheio do horror da guerra e da perseguição aos judeus, mas também cheio de humanidade e solidariedade: “A Lista de Schindler”, vencedor de 7 Oscars. Incontáveis obras da sétima arte cumpriram o papel do cinema de registrar um dos mais dolorosos períodos da História da Humanidade, em que a mente diabólica de Adolf Hitler, com seu monstruoso propósito de limpeza étnica, escreveu a mais repugnante página dessa História.

AMORES CLANDESTINOS
E os homossexuais? Vítimas de leis cruéis e políticas hipócritas, estão vendo agora em todo o mundo acontecerem mudanças positivas em função de suas antigas reivindicações, que vem retirando as relações homoafetivas dos guetos e da clandestinidade. O chamado “casamento gay”, que dá às pessoas do mesmo sexo o direito à união civil, já é uma realidade em muitos países do mundo. Os que não se abriram a essa discussão terão de fazê-lo, é inevitável. Porque as sociedades, através dos tempos, precisaram sempre se incomodar com a escolha sexual das pessoas? Filmes magníficos também acrescentaram, se não foram todas as respostas, elementos fundamentais para a reflexão do público. Basta ver (ou rever) “Milk”, sobre a militância de um político gay, com a premiada atuação de Sean Penn (Oscar de melhor ator), o belo e sofrido caso de amor entre dois cowboys em “O Segredo de Brokeback Mountain”, dirigido por Ang Lee, ou o clássico de William Wyler ( o mesmo diretor de Ben-Hur, em que uma atração homossexual é fortemente sugerida entre as personagens viris de Ben-Hur e Messala) , o contundente drama “Infâmia” (The Children´s Hour), com as soberbas interpretações de Audrey Hepburn e Shirley MacLaine.



Busquemos por esses filmes nas locadoras, nas lojas, nos sites de vendas de filmes. Veremos que, diante de obras maravilhosas como essas, até os cérebros mais emparedados e os corações mais duros tenderão a amolecer...

sexta-feira, 5 de abril de 2013

SOBRE JESSICA E JACK


Por José Farid Zaine
farid.cultura@uol.com.br         
Twitter: @faridzaine      
Facebook: Farid Zaine   
Acesse WWW.faridzaine.com


“Mama”,que estreia hoje no Brasil, tem um nome usado como chamariz, que é o de Guillermo Del Toro, mas ele não é o diretor, é apenas produtor. O diretor é um de seus discípulos, Andrés Muschietti. Del Toro passou a ser uma marca respeitada desde o lançamento de “Labirinto do Fauno”, que ganhou 3 Oscars (teve seis indicações), e que usa o recurso do fantástico para explicar a dura realidade que cerca as personagens. “Mama” parecia querer beber na mesma fonte, mas tomou outra direção, a dos remakes de filmes japoneses de terror que fizeram muito sucesso no mundo todo, como “O Chamado”.



Em “Mama” temos a presença importante de Jessica Chastain, uma das atrizes mais requisitadas da atualidade e que está num dos melhores filmes de 2012, “A Hora Mais Escura”,pelo qual foi indicada ao Oscar. Recentemente ela também foi indicada para melhor atriz coadjuvante por “Histórias Cruzadas” (The Help), depois de ter sido muito elogiada por sua atuação no belíssimo “A Árvore da Vida”(The Tree of Life), de Terrence Malick, de 2011. Ela está  no magnífico “O Abrigo” (Take Shelter), de Jeff Nichols, também  de 2011. Todos merecem ser vistos para que se confirme a versatilidade da atriz.
 Em “Mama” Jessica Chastain  está morena e de cabelos curtos, muito bonita como uma roqueira que mora com o namorado e que celebra por não estar grávida...uma tragédia envolvendo o irmão gêmeo de seu companheiro, coloca-a diante de um desafio surpreendente, o de cuidar de duas meninas que ficaram isoladas num casebre em uma floresta por 5 anos. Ao cuidar das crianças, ao mesmo tempo em que um psicólogo pesquisa a história de uma entidade mencionada pelas meninas, ela desenvolve o instinto maternal e passa a protegê-las, causando ciúme na tal entidade, a quem as crianças chamam de “Mama”e que, a seu modo, as teria protegido e alimentado no tempo em que permaneceram na floresta.
“Mama” tem um início dramático e perturbador, causa alguns sustos, tem um clima permanente de terror, mas abusa dos clichês. Poderia ser um grande filme do gênero, mas perdeu muito ao se igualar a outros exemplares do mesmo tipo, ao invés de fugir deles, rumo a um desenrolar que poderia ser muito mais criativo.


JOÃO E O PÉ DE FEIJÃO
A clássica história infantil “João e o Pé de Feijão” chegou ao cinema pelas mãos de um diretor que não brinca em serviço, o ótimo Bryan Singer, que nos deu um filme premiado e aclamado em 1995, “Os Suspeitos”, e depois conduziu com classe os blockbusters “X Men” e “X Men 2”. A sua experiência anterior foi fundamental para que “Jack, o Caçador de Gigantes” não se transformasse numa aventura infantiloide e ridícula, como é o caso recente de “Oz – Mágico e Poderoso”, um fiasco apenas artístico, porque já arrecadou milhões de dólares nas bilheterias.
“Jack”, que estreou na semana passada no País,  agrada pelo seu visual caprichado, pelos abundantes e competentes efeitos especiais, pelos toques de poesia e encantamento que as fábulas merecem, pelo humor delicado e pela originalidade de seus monstros, tão divertidos quanto cruéis. Um ótimo passatempo.



Se alguém estiver em dúvida entre abrir o tenebroso armário de “Mama” e topar com seus fantasmas, e viajar para uma terra de gigantes famintos a bordo de um veloz pé de feijão, ajudando Jack a salvar a Princesa, recomendo que vejam os dois: afinal, merecemos emoções diferentes, e é certeza de que nem “Mama” e nem “Jack” pararam por aí.

terça-feira, 2 de abril de 2013

QUEM FOI O MELHOR JESUS?



Por José Farid Zaine
Twitter: @faridzaine
Facebook: Farid Zaine
Acesse www.faridzaine.com




Hoje estreia a peça Via-Sacra, em sua vigésima terceira edição, mantendo uma tradição que iniciamos no ano de 1990, no governo do Prefeito Paulo D´Andréa. A encenação acontece no Parque Cidade de Limeira, às 20h, havendo apresentações no mesmo horário amanhã e depois. Assina a direção Jonatas Noguel, e quem faz Jesus é o jovem ator Matheus Gonçalves. Amanhã acontece também a “Via-Sacra no Morro da Penitência”, no Jardim Olga Veroni, iniciada com o saudoso Padre Maurício, da Paróquia Santa Luzia. Desde sua criação até 2005, a “Via-Sacra” acontecia na Praça Toledo Barros. Quando tivemos a ideia de fazer a grandiosa montagem na Praça, foi em função da história de que o arquiteto que projetou a Gruta colocou nela 33 degraus, uma referência à idade que Jesus tinha ao ser crucificado. O fato, curioso, nos motivou a usar o cartão postal  de Limeira  como o cenário do Calvário, da Crucificação e da Ressurreição, um cenário perfeito bem no meio da Praça central da cidade. O primeiro diretor foi Carlos Jerônimo Vieira e o primeiro Jesus foi Vicente Mosciaro Neto, até hoje lembrado por sua incrível performance. Vieram outros diretores, outros atores, houve a necessidade de mudança de local, mas o espetáculo continua, e esperamos que tenha vida longa. Nos anos 1960 foi encenada a “Paixão” na Catedral Nossa Senhora Das Dores, com Emiliano Bernardo Silva no papel de Jesus.
Assim como aqui em Limeira  e em dezenas de cidades pelo Brasil afora, a Paixão de Cristo é um dos temas mais recorrentes no teatro popular. Eu mesmo escrevi e dirigi o “Auto da Paixão”, há onze anos encenado em diversas comunidades, tendo sido levado até a Catedral da Sé e Igreja Nossa Senhora do Brasil, em São Paulo, sempre com elenco de limeirenses.
O cinema nos deu grandes filmes sobre Jesus, principalmente sobre sua morte e ressurreição. Recentemente causou polêmica mundial o filme de Mel Gibson, “A Paixão de Cristo”. Jim Caviezel compôs um Jesus dilacerado, com o corpo retalhado por chibatas cheias de artefatos pontiagudos, cortantes. Nunca o sangue de Jesus jorrou tanto na tela, misturado a poeira, suor e lágrimas. A interpretação de Caviezel ficou amarrada às suas sessões de tortura extremamente violentas.
Os olhos azuis de Robert Powell, e sua cabeça envolvida por um manto rústico, são as imagens que ficam do filme de Franco Zeffirelli, “Jesus de Nazaré”, inicialmente uma minissérie para a TV Britânica. Sempre em busca de um visual elegante, o diretor de “Romeu e Julieta” conseguiu fazer um filme bastante popular, principalmente pela docilidade da personagem principal e pela beleza plástica da obra.
Não muito visto por grandes plateias, mas obrigatório para quem curte cinema de ótima qualidade e gosta do tema, está o filme canadense de Denys Arcand, “Jesus de Montreal”, sobre a montagem de uma peça sobre a Paixão de Cristo em Montreal. O ator é Lothaire Bluteau.
Willem Dafoe deu uma cara estranha para Jesus,tornando-o mais humano do que divindade,  no mais polêmico filme de Martin Scorsese, “A Última Tentação de Cristo”. Belo filme e ótima criação de Dafoe.
Um Jesus diferente, até por conta do que é dito no texto original de Ariano Suassuna, é o ator negro Maurício Gonçalves na comédia dramática “Auto da Compadecida”, minissérie da Globo depois transformada em longa para o cinema.
Numa superprodução dirigida por George Stevens, “A Maior História de Todos os Tempos” o ator sueco Max Von Sydow foi quem emprestou o rosto para Jesus. O filme é de 1965 e obteve 5 indicações ao Oscar.
Com muito menos glamour, a história de Cristo foi contada de forma extremamente realista por Pier Paolo Pasolini, em preto e branco e com um elenco que incluiu gente do povo, sem nenhuma experiência anterior, o que conferiu mais autenticidade à narrativa. Jesus era interpretado por Enrique Irazoqui.
“Jesus Cristo Superstar” e “Godspell – A Esperança”, nos trouxeram Cristo através da música,em grandes sucessos da Broadway adaptados para a tela grande. Ted Neeley foi o Jesus cantor de “Superstar” e um Cristo hippie, de cabelos encaracolados, soltou a voz em “Godspell”, na interpretação de Victor Garber.
Mas quem deseja escolher a face de Jesus no cinema jamais pode deixar de ver “O Rei dos Reis”, belíssimo filme de Nicholas Ray, com uma trilha sonora empolgante e até hoje usada em espetáculos do gênero, e com o ator Jeffrey Hunter interpretando Jesus. Seria ele o melhor Jesus do cinema? Ele é considerado o mais belo, com seu ar de divindade e seus famosos  olhos azuis.
Assistam a outros filmes, caros leitores e leitoras. Descubram o prazer de ver o mesmo tema tratado de formas completamente diferentes. E escolham aquele ator que, por seu olhar, sua postura, sua voz, mais tenha se aproximado da imagem que vocês criaram do filho de Deus. Muitos atores podem ser citados como “Melhor Jesus” do cinema, mas só um , o próprio Jesus, poderá ter o título de “ O Melhor dos Homens” !